segunda-feira, 30 de novembro de 2009

REPETECO // Mãe Linda // Mãe Linda nasceu perto do mar. Tinha os olhos da mãe de todas. Um verde azulado que sorriam quase fechando, e dava bom dia, porque todo dia era bom! Diziam na região, que quando olhou o lago pela primeira vez, o barro arriou e tudo a volta ficou transparente. Mas era do outro lado da península que fizera casa. Perto do mar, na frente dele. Vivia de branco e laranja. Traços finos e nariz arrebitado. Era de Oxum, mas nadava nas águas de Iemanjá! Para os homens da região, escultura intocada e benção divina. Lágrima derramada de uma áfrica generosa; Chororô de filho velho que pendia de colo e aconchego. E eram muitos... De todas as cores e credos. Até beata se curvava quando Mãe Linda Passava... E cumprimentava a realeza, de uma terra que não caminhava, a beata feia e enrugada, de timbre estridente. Senhorinha que falava arredondando o “R”, em nome de um Cristo que só existia na cabeça dela, diluído em bíblias traduzidas e tecido adiposo. Jesus, o homem. Cristo, o Deus. O homem de Deus nunca renegaria a boa fé. Viesse de torres ou terreiros! Isso dizia Mãe Linda. A beata que temia Deus e por isso se ajoelhava, cumprimentava. Por respeito, ou medo, dos céus, ou lá do que. Naquelas bandas não se criava quem entortasse o tempo quando ela passasse. E era linda, uma alegoria intocada, empurrando o vento, limpando o céu enuviado de cabeça torta. Estrelando o negrume do tempo que nunca era feio. A terra precisa beber... Dizia... Água de esmeralda, quando batia no sal. E era tudo o que se via... E quando a noite acalma, e Oxum sussurra brisa, é porque tá guardando a luz alaranjada de sol atrás das nuvens, como criança com boneca. Que acorda com riso de que a vida continua... Busco um pai num céu de estrelas // pra justificar meu desamparo // uma aresta ou um aro // que me dê a sensação de colo // que minha mãe me dava // quando voltava pra casa // Ah! Ah! // quando voltava pra casa. E puxavam o arrastão, com calo de pescador... Um negro entoava o que a massa repetia. Louva a mãe, a pesca vem. E o Pai que com ela conversava... Rezavam em silêncio, e eram todas as esposas daquele lugar. E puxa, puxa... A rede tem que ser recolhida antes da maré subir... Nunca soube ao certo aonde era. Nunca! Um sonho quase difícil de não parecer verdade... Quando a vi pela última vez, acordei sem querer. O mesmo sorriso de sempre prenunciando um dia bom. Fosse todo, ou somente uma parte dele, seria. Com cheiro de café e dentes de giz, que o mesmo melhor amigo me disse. - Olha as flores! É minha mãe! E todas que acalentam o sono, e a criança da criança que adormece durante a calmaria de um oceano inteiro. O velho que deixava de ser pai e tava longe. E o outro cantado, com palavras de mãe... Antes de dormir pedirei por empréstimo os raios dourados de Oxum e um sono silencioso. Se não for demais, um espelho cristalino, tão grande, mas, tão grande, que suas mãos entornarão ondas suficientes para inundar o sonho de nunca mais acordar, desacompanhado de paz...