terça-feira, 13 de abril de 2010

A SEGUNDA PÁGINA // Quando por fim sentou a mesa da estalagem o rapaz imediatamente abriu o livro com uma delicadeza ímpar... Diziam que era muito velho o escritor. E que era difícil segurar a bengala que apoiava; falar e acordar. E duvidaram alguns que ainda pudesse manipular frases e palavras e letras que viessem a refazer qualquer argumento. E continuava a primeira página: escrevi e não disse nada a ninguém... Seguia dizendo que durante duas semanas esteve sentado no canto parado daquele lugar. Sentiu o frio enrijecer as vértebras e o restante dos ossos. Chorou cada sonho realizado durante uma vida quase inteira. E os que não aconteceram também. Talvez porque não devessem... Ter acontecido... Então por este caminho haviam sido realizados sim! Os amores que carregara ao longo não envelheceram pois nunca mais havia visto ninguém. Nenhuma delas!... Percebessem o filme da sua alma veriam um jardim cheio moçoilas correndo sem roupa pelos cantos da tela... Enquanto chorava entendia que escorria dos olhos a água mais pura e salgada do oceano profundo das suas estórias. Aquela que desenhava transparente sem o julgamento de um motivo qualquer. Todo homem chora algum dia. Por uma razão sem dono todos choram! E perdoando nossas lágrimas isentamos erros de culpa... Amaria cada uma daquelas mulheres de novo. E novamente sonharia um devaneio antigo e choraria e riria como antes. Como renascer para num dia breve adormecer em paz. Ou acordar novamente vestido de filho, criança ou coisa parecida... Olhou silencioso, o moço... Depois gesticulou novamente... Apontou o lápis e a data... E começou a segunda página...