quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Navio Negreiro

E pensar que o comércio de escravos teve sua origem na África... Ao que consta, mais precisamente no Benin. Era a tentativa de pertencer ao comércio internacional e alcançar outras esferas de negócio. Tribos conquistadas sendo diluídas pelos seus colonizadores de mesma cor. Depois, passados os portais que ligavam o piso até a areia, água salgada, e finalmente o porão dos navios... Já em terras portuguesas, eram misturados em alas para que perdessem suas idéias e dialetos, ou toda expressão originária... Esqueciam-se algozes, contudo, que o talento nato e humano para adaptação, ainda mais quando sob pressão, é de incomensurável poder. E isso é histórico! Acho que poderíamos chamar de traduções oficiais do que viria a ser uma nova perspectiva social, letrada e mapeada? Não somente cantada, como o correio informal de séculos anteriores... E a cultura negra reformulada nas senzalas, mesclada em todos os cantos deste país, prenunciava suas raízes para todo o sempre, no esqueleto da memória nacional... Enquanto isso, Pierre Verger, o francês de alma baiana, que se autodenominava etnólogo e muito tempo depois trocariam a sua velha Paris pela África e, mais tarde ainda, em definitivo, o mundo por Salvador. Tornar-se-ia um Fatumbi; o que na tradução literal significa renascido através do Ifá. O jogo das previsões...

Rapidamente sobre Ifá; reza a lenda que era feiticeiro e irmão de Alá, eternamente venerado nos desertos e países Árabes.

Percebendo certa falta de identificação com a rapaziada barbada, bateu perna até chegar a território africano, onde fora muito bem recebido. Em agradecimento, ensinava o jogo das previsões, que tinha o seu nome, e colo certo... Cada burgo tinha um Fatumbi...

Era interessante, porque já naqueles tempos, objetos e mensagens eram enviados através de Verger. Cada vez que anunciada era uma nova partida. E aquela troca, quando identificada em outro continente, traduzia a prova e veracidade dos fatos contados, da existência dos parentes perdidos, e da certeza longe, que se juntava.

Depois de dias e meses... Mares... Adentro. A partir dele, souberam muitos dos seus!... Muitos anos depois. E num pensamento maior, isso era suficiente...

E registrava na sua velha máquina fotográfica analógica, o que muitos hoje consideram um dos primeiros registros visuais do que viria a ser a cultura do candomblé.

Mas... Outra surpreendente curiosidade que nos remete ao início desta historieta, é que, os que por sua vez se intitulam Tatás, na África, são descendentes diretos de traficantes de escravos. Agora, com nova e pomposa titulação. Propagadores da cultura (?)!

E calcula-se em mais de cinco milhões o número de negros que aportaram contra a própria vontade em territórios luso-brasileiros... Louvo agora aqueles que ficaram ao longo. Um sem número que nunca nessa vida poderemos precisar...

Outro dado curioso é que muitos creditam a Capiba, Verger e Jorge Amado, boa parte da projeção do que viria a ser um frenesi internacional em torno da Bahia de todos os santos. Que me perdoe S. Dorival, mas das tríades baianas, talvez esta fosse munida de particular singularidade. Isso por, além de tudo, tratar-se de um argentino, um francês e um brasileiro.

Tudo bem que Jorge Amado Jamais fora um só, e Santo Amaro da Purificação pariu boa parte da nata. Além é claro, da própria capital. Mas que o poder desta terrinha em repatriar sua gente e redescobri-la, nos confins do mundo afora, só pode ser... Divino! Acredito nisso... Você eu não sei, mas eu...